Frei Hermínio Bezerra de Oliveira
(Numismata)
Da Academia Metropolitana de Letras de Fortaleza.


A Fazenda Bom Sucesso, de Manoel José
D’Oliveira, por sua localização e a situação hídrica, reunia condições para a
construção de um “rodeiro” de beneficiar
café. Com o “rodeiro”, boa comunicação e a
confiabilidade da vizinhança, ele passou a beneficiar quase todo o café da
serra de Baturité. Assim, ele tornou-se um dos maiores proprietários da região
no final do século XIX e início do século XX.

Na Fazenda Bom Sucessso estabeleceu-se um peculiar
sistema econômico. Naquela época não havia inflação mas, no inverno, o café
tinha ainda mais valor por ser mais difícil. Por seu volume de negócios, o Sr.
Manoel José D’Oliveira Figueredo passava o verão na serra e o inverno no
sertão. A Fazenda ficava próxima à então vila de Guaramiranga, não longe do
topo da serra. O clima da região era petropolitano, chegando a 13º nas noites
mais frias, quando hoje não sei se chega a 16º. Havia uma garoa persistente,
uma frequente neblina e uma brisa prazerosa constante, algo para muitos inimaginável,
no nordeste do Brasil.
À época eram
vários os proprietários notáveis: Sr. Clementino Holanda, do Sítio Monte Flor; Sr. Filomeno Gomes, do
Sítio Nova Friburgo, perto de Pacoti;
Sr. Joaquim Torcápio, do Sítio Cana Brava;
Sr. Bráulio Holanda, do Sítio Monte
Alegre; Coronel Alfredo Dutra, do Sítio
Álvaro; Coronel Chichio de Mattos Brito, do Sítio Brejo; Coronel Linhares e Dr. Caracas, do Sítio Venezuela, estes familiares de
José Linhares, ex-presidente do Brasil, (de 29/10/1945 a 31/01/1946), e vários
outros. Havia outrossim, muita animação sociocultural na região. Alguns dos
filhos dos proprietários iam estudar na Europa, sobretudo, em Portugal.

Com
o passar dos anos a cultura do café na região teve sua decadência por vários motivos,
inclusive, o cansaço da terra pelas repetidas queimadas e a falta de insumos
adequados. Entre 1910 e 1930, alguns dos sítios foram adquiridos pelos irmãos
Boris (da firma de exportação e importação Boris
Frères & Cie). Outros
entraram em decadência com a morte dos proprietários e o desinteresse ou
impossibilidade dos herdeiros em mantê-los. Muitos preferiam viver em Baturité
ou em Fortaleza.
O
Sr. Manoel José D’Oliveira Figueredo também foi atingido pela crise.
Comerciante correto e probo, ele passou cerca de dois anos comprando as suas
próprias moedas de quantos as possuíam. Após juntar o máximo que pôde, agora,
já sem poder aquisitivo, deu-as ao Coronel Aprígio Alves Barreira Cravo, do Sítio Pau d’Alho, em Pacoti, que em
agosto de 1889 recepcionou o Conde D’Eu para um almoço, em sua viagem pelo
Nordeste. O Sr. Manuel José entrou em estado de falência na maioria de seus
negócios. Desesperado, ele pôs fim à sua própria vida de uma maneira trágica:
fincou um punhal num portal e jogou-se contra o mesmo. Requiescat in pace!
Quanto às moedas, elas passaram por várias
mãos. O Coronel Aprígio – herdeiro em confiança – vendeu seu Sítio Pau d’Alho, ao Coronel José
Marinho de Goes, porém, deu as moedas e as louças da Casa Grande, ao Coronel
Zeca Sampaio, do Sítio São Luis.
Desde 1920 essas moedas permanecem entre os descendentes do Coronel Zeca
Sampaio: Luís Cícero Sampaio (filho); depois, Onofre Medeiros Sampaio (neto) e
atualmente, com o Sr. Francisco Luís Oliveira Nepomuceno (bisneto). Até 1980,
elas continuaram a circular exclusivamente no Sítio São Luís, não como moedas, mas apenas como “fichas”, para
apanhadeiras de café. A cada balaio de café apanhado a pessoa recebia uma, e,
no final do dia, contavam-se os balaios, pelo número de moedas que cada uma
detinha era feito o pagamento.
Como
vemos, estas moedas fizeram história. Mesmo após encerrarem o seu ciclo
produtivo, elas têm hoje, um elevado valor numismático e histórico, por sua
inestimável contribuição ao progresso, como capital que produziu trabalho e gerou
riquezas no maciço de Baturité e circunvizinhança.
Hoje
estas moedas são peças especiais de museus e os numismatas as caçam, como raridades.
A elas aplica-se com muita justiça, a frase do grande médico grego, Hipócrates:
Ὁ βἰος βραχὐς, ἡ δὲ τέχνη μακρή
= A vida é breve, a arte é longa. Sêneca
repetiu-a em: Ars longa, vita brevis =
A arte é longa, a vida é breve. Em apenas vinte anos de vida útil e produtiva,
o Alqueire, a Terça e a Quarta – da
Fazenda Bom Sucesso – tornaram-se
perenes.
O
Sítio São Luis com 250 hectares,
sendo 150 de mata nativa, continua ativo. Pertence à Sra. Cláudia M. Mattos
Brito de Goes. A produção de café na região diminuiu
muito nas décadas 1980/1990, mas desde 2015, com a criação da Rota
Verde do Café da Serra de Baturité, a Casa Grande, com a sua bela colunata, é
aberta a visitantes
nos finais de semanas.
É possível uma visita histórica guiada, mas com agendamento prévio pelo site: www.facebook.com/institutositiosaoluis. Além da Casa Grande com suas 30 colunas e o silêncio do local, há um entorno maravilhoso com ótimas opções de lazer.