domingo, 3 de janeiro de 2016

OS SELOS LOCAIS BRASILEIROS POR ADOÇÃO - II

Artigo de Carlos Alberto Tavares Coutinho


Jules Gros continuou a se declarar presidente da República de Counani até 1891 quando morreu. Após a morte de Jules Gros, entrou em cena Adolphe Brezet. Foi soldado na Guiana aos 26 anos e como o antecessor era muito vaidoso. Levou o cargo a sério e emitiu os selos na seguinte ordem:
1ª Série em janeiro de 1893
2ª Série em junho de 1893
Correio Oficial em agosto de 1893, com sobrecarga (6 valores)
4ª Série em setembro de 1893 - Taxas, Registro

Em princípios de 1893 a vida em Counani volta à normalidade, e o episódio da Primeira República parece que foi esquecido. A maioria da população, formada por brasileiros, vivia da coleta de especiarias, da pesca nos lagos e do fabrico de grude de peixe para um comércio manhoso. Dois garimpeiros brasileiros e naturais de Curuçá, no Pará, os irmãos Germano e Firmino Ribeiro, após tanta procura, descobriram ouro na bacia do rio Calçoene, em Lourenço, os ânimos passam a se acelerar mais na região do Contestado e começa a modificar o quadro, isto causou uma verdadeira corrida sem precedentes, com aventureiros de todas as nacionalidades invadindo a região, a população, em poucos meses, de 600 habitantes chegou a 5 mil, só em Counani. A descoberta do referido metal também provocou um crescimento desordenado, aumentando inclusive a violência e os problemas de saúde em consequência pela falta de saneamento.
Sabedor do achado do ouro, o governador da Guiana Francesa, Mr. Charvein, cuidou logo de colocar um representante da França baseado no Amapá (àquela época vila). Assim, Eugene Voissien é escolhido para assumir a função de delegado da região contestada, representando os interesses da França. Com essa regalia, Voissien passa a fiscalizar a região. facilitando assim todo o trabalho de coleta do ouro, que era desviado para o lado francês, que se arvorava na cobrança de altas taxas de impostos e que veio mais tarde proibir o acesso de brasileiros à área aurífera, franqueando o direito apenas aos "crioulos" de Caiena. Esse período, que vai de dezembro de 1893 até novembro de 1894 é, para alguns brasileiros um período de intranquilidade, pois incontáveis vezes alguns garimpeiros foram aprisionados por Voissien, que alegava a prática do contrabando. Outros achavam que tais denúncias eram vazias, defendendo um pouco a imparcialidade discutida de Charvein.
Com a situação criada por Voissien, os amaparinos começaram a reagir e o primeiro passo foi cassar os direitos do representante francês. Assim, a população reunida em 26 de dezembro de 1894, depôs Voissien e criou um governo triúnviro, do qual assumiram o cônego Domingos Maltez na presidência, tendo como vices Francisco Xavier da Veiga Cabral e Desidério Antonio Coelho. A sugestão do Triunvirato foi de Desidério que, escolhido no dia 10 do mesmo mês para ser o líder de um governo independente no Amapá, sugeriu uma nova reunião para que a administração passasse a ser exercida por três pessoas. No dia seguinte é criado o Exército Defensor do Amapá, para tentar garantir a ordem no local. A formação do governo triúnviro é comunicada em seguida a Belém.
Com o afastamento de Adolphe Brézet, aventureiro que se dizia presidente de Counani, em 1894, logo outro chamado Albert Franken passou a se arvorar presidente de Counani.
O cônego Domingos Maltez, no dia 19 de fevereiro de 1895, deixa a presidência do Triunvirato e assume, em seu lugar, o vice, Cabralzinho. Uma das primeiras providências tomadas por Cabral foi atender a uma carta assinada pela população de Counani relatando o ressurgimento de Trajano na vila de Counani, Trajano continuava com suas atitudes de perseguição aos brasileiros que se fixassem por lá, chegando até mesmo a rasgar a bandeira brasileira e, em seu lugar, fazer tremular a francesa, sob os acordes de Marselha.
Sem procurar instaurar qualquer inquérito, o que era de praxe nessas situações, Cabralzinho enviou uma guarnição a Counani para mandar intimar e prender Trajano. Foi encarregado da missão o major Félix Antonio de Souza, que levou consigo uma proclamação oficial do Triunvirato aos brasileiros daquele distrito.
No dia 15 de maio de 1895, uma quarta-feira, a população adulta se encontrava nos seus afazeres diários, seja no centro da vila, seja no campo, tomando conta do gado ou das "tarefas da roça". Cabralzinho encontrava-se em sua casa descansando, próximo à Igreja, pois havia chegado de madrugada de uma viagem que fizera, para atender a uma criança doente na região dos Lagos.
Os franceses desde cedo vinham subindo o rio Amapá Pequeno, a bordo da canhoneira Bengali, pilotada por um brasileiro de nome Evaristo Raimundo, com 80 "gendarmes" da Legião Estrangeira comandados pelo capitão-tenente Lunier chegaram para obedecer às ordens do governador de Caiena, Mr. Charvein, que queria a prisão imediata de Cabralzinho e que o levassem para Caiena, caso este não colocasse em liberdade o "delegado" francês Trajano, que havia sido feito prisioneiro do Exército Defensor do Amapá, uma força paramilitar comandada por Cabralzinho.
Os invasores desembarcaram às 9 horas e foram logo em direção à residência de Cabralzinho. A casa foi cercada por uma patrulha enquanto que outra vinha do outro lado, deixando um rastro de mortes entre velhos, mulheres e crianças amaparinas.
As declarações do capitão Lunier foram ouvidas com bastante clareza. Diante da negativa de Cabralzinho, formou-se o combate. Com poucos minutos os amigos de Cabral começaram a vir. Se Cabralzinho matou ou não Lunier com a própria pistola do gendarme francês, agora o fato não interessa e talvez por causa da morte de seu comandante, os franceses começaram a lutar descontroladamente, e preocupados com a baixa da maré que provocaria, com certeza, o encalhe da embarcação, que tinha casco muito fundo, acabaram fugindo na canhoneira. O conflito demorou menos de duas horas, a invasão à vila de Amapá, sede do Triunvirato, deixou um saldo de dezenas de mortos e feridos do lado brasileiro, alguns soldados do lado francês e a morte do capitão Lunier.
No Brasil a Imprensa se movimenta com protestos contra a pretensão do governador de Caiena, Mr. Charvein, em pretender fuzilar os brasileiros levados prisioneiros pelos franceses. O próprio governador de Caiena coloca como prêmio de um milhão de francos a quem capturar vivo Cabralzinho. Em 25 de setembro de 1895, O governador Charvein, principal responsável pelo massacre de Lunier ao Amapá em 15 de maio, é demitido e substituído por Mr. Lamothe, que recebe autorização para devolver, imediatamente, as bandeiras brasileiras e os prisioneiros encarcerados, para partirem no primeiro navio a sair de Caiena.
A reação dos brasileiros e o massacre de amapaenses ocorrido na vila apressou de uma vez a resolução do conflito do Contestado, em 1897, com Trajano preso, José da Luz Sereja se tornou o capitão da vila do Cunani. Ele será o interlocutor entre a delegação francesa, designada em 1897 para participar da Comissão Mista de Administração, e a delegação brasileira. A comissão, reunindo franceses e brasileiros, tinha a intenção de regulamentar o contencioso do Contestado. Contudo, o rápido crescimento da vila, a diversidade de imigrantes e a animosidade entre as delegações francesas e brasileiras geraram problemas de convivência com assassinatos, roubos e outros tipos de violência.
A resolução do contencioso do Contestado, em 1900, pela arbitragem suíça, que definiu o rio Oiapoque como limite da posse entre brasileiros e franceses, põe fim à presença oficial dos franceses na região e na vila do Counani, mas não às relações comerciais e à presença de moradores guianenses. Um termo de compromisso assinado no Rio de Janeiro, em 10 de abril, pelos delegados do Brasil (Ministro Gabriel e Piza) e da França, confiava a resolução do Contestado á arbitragem do presidente da Confederação Suíça, Walter Hauser, e o advogado Barão do Rio Branco (José Maria da Silva Paranhos), especialista experiente em questões de fronteiras, é escolhido para defender o Brasil. Este encargo foi confiado, primeiramente, a Ruy Barbosa, mas este hesitou em assumir a questão, indicando como mais experiente que ele nesses assuntos, seu colega Barão do Rio Branco.
Após inúmeros estudos e conferências, a sentença foi pronunciada pelo governo suíço, três anos mais tarde, isto é; em 1º de dezembro de 1900, fixando ao Brasil a posse definitiva da região contestada, que se situava entre o Oiapoque e o Araguari. A data de lº de dezembro ficou consolidada como o nascimento do Amapá como parte territorial integrativa. Fixada a fronteira entre o Brasil e a Guiana Inglesa, mais uma vez parte do pretendido território da Republica foi definido como brasileiro. 
.Em 1901, novamente Adolphe Brézet se declara presidente de Counani em substituição a Albert Franken.

(continua) 

Um comentário:

  1. Boa Tarde prezado Carlos, excelente o artigo e qual muita gente não sabe da existência da história, tampouco dos selos
    Abraço

    ResponderExcluir