domingo, 3 de fevereiro de 2013

As Razões do Cobre – moedas no fim do século XVII



Paulo Avelino
paemail-snfce@yahoo.com.br

Uma moeda de cobre de 1699

Uma moeda de cobre abre a minha pequena coleção – é a mais antiga datada que possuo. A moeda de XX réis de 1699 tem sua beleza: letra monetária de quatro letras P envoltas em quatro crescentes, a inscrição Moderato Splendeat Usu (Brilhará com usos moderado) e na outra face a informação do soberano, PETRUS II D.G. PORTVG. R.DAETHIOP (Pedro II pela graça de Deus Rei de Portugal e da Etiópia).

O passado [dizem] é um país que não existe. Ou, se existe, ao menos é distante. Os selos e moedas diminuem [podem diminuir] essa distância que se metamorfoseia em estranheza.

O bimetalismo

Voltemos a um tempo em que as cédulas quase não existiam. Existiam quase que só as moedas. Essas tinham um valor intrínseco, ou seja, o metal do qual eram feitas tinha valor. E também [é claro] possuíam um valor extrínseco, ou seja, o seu valor de face. No caso da minha moeda, XX réis. A quantidade de dinheiro em um país dependia portanto da quantidade de metal precioso que nele havia.

Por metal precioso entenda-se quase que sempre ouro e prata. Daí bimetalismo.

Tal sistema gerava problemas muitos.  Os reis tinham a trabalhosíssima tarefa de regular o valor intrínseco e o valor extrínseco. Senão:

·         se o valor do metal se tornasse maior que o valor de face da moeda, as pessoas simplesmente fundiriam a moeda para vender o metal;
·         se o valor de face fosse muito maior que o valor do metal, havia um enorme estímulo à falsificação (lembremos que estávamos em um tempo sem polícia organizada, nem fichários computadorizados com informações sobre todos os cidadãos, nem análises informatizadas da composição metálica de uma moeda).

O bimetalismo armou uma bomba-relógio monetária, pois a moeda, fator essencial à circulação econômica, nesse sistema dependia de fatores fora de muito controle, como os fluxos de metal em relação ao exterior, e, pior ainda, a descoberta de minas, as quais, na Europa, caminhavam para o esgotamento. E as economias cresciam, reclamando mais moedas. As queixas de falta de dinheiro se generalizavam.

Os reis de Espanha (com a prata de Potosí) e de Portugal (com o ouro das Minas Gerais) soltaram foguetes com a descoberta desses metais, já sabemos o porquê. Se não usaram esses metais para desenvolver seus países, é história outra.

Brasil – uma economia (quase) sem moeda

Todos sabemos que a economia brasileira nos primeiros séculos dependia da escravidão. O trabalho escravo é gratuito. Não precisando ser pago, não necessita de dinheiro. Assim, a economia funcionava com bem pouca necessidade de dinheiro. É um fato bem estabelecido pelos clássicos como o justamente festejado Celso Furtado, na Formação Econômica do Brasil.

No entanto, mesmo precisando de pouco dinheiro, ainda precisava de dinheiro. E na medida em que a economia cresceu no século XVII, as queixas de falta de moeda detonaram por toda a colônia.

A economia europeia se contraiu em forte recessão entre 1670 e 1680, o que não deixou de afetar o mercado do açúcar, o principal produto da Colônia. O fluxo de metais, ou seja, a entrada de ouro e principalmente de prata, da qual há indícios até aquele momento que fosse positiva, tornou-se negativa – saía mais que entrava. Isso porque os comerciantes portugueses, que traziam produtos europeus para vender aqui, e que antes compravam açúcar e fumo para revender na Europa, passaram a preferir levar moedas daqui – era mais seguro diante de um mercado instável. E, lembremos, não havia Casa da Moeda aqui. Moedas eram literalmente artigos de importação.

Aumentou a grita por moeda, na segunda metade do século XVI, em toda a Colônia.

O Levantamento não solucionou

Os reis podiam determinar que uma moeda fosse recarimbada e passasse a valer o valor nominal aumentado. Isso elevava como mágica a quantidade de moeda em circulação e, se o carimbo valesse só em um lugar específico, como a Colônia, haveria estímulo para manter a moeda no lugar. As Câmaras Municipais berraram por todas as últimas décadas do século XVII para que o Rei o fizesse. Algumas perderam a paciência de esperar e o fizeram por conta própria. O Rei acabou autorizando um levantamento de dez por cento, bem menor que o reivindicado.

O Levantamento só resolvia a curto prazo. Com o tempo os preços subiam e a moeda escasseava de novo.

O Cobre, moeda de pobre

A maior parte da população só via em toda sua vida as moedas de cobre. Faziam os pequenos pagamentos, os trocos e as esmolas. Também havia na Colônia grande falta delas, agravada pelo fato de que:

·         não se produzia cobre em Portugal; ele era importado da Alemanha e da Inglaterra (ver artigo sobre moedas de cobre no Reinado de Dom Pedro I, neste blogue);
·         o cobre tinha grande utilidade além de fazer moedas; numa época de navios de madeira corroídos por crustáceos, o cobre protegia os cascos dos navios; e os artefatos metálicos dos engenhos de açúcar, como os panelões, eram de cobre. A produção de açúcar se recuperou um pouco na década de 1690, o que gerou maior pressão ainda sobre o cobre para moedas.

Por que e como veio a moeda de 1699

Depois de muita pressão, o Rei Pedro II autorizou a cunhagem de moedas de ouro e prata na Colônia. Quanto ao cobre, nada disse. A maior circulação de moedas de maior valor puxou mais ainda a demanda por moedas de menor valor e a solução veio de que, entre 1693 e 1699 a Casa da Moeda do Porto cunhara moedas para Angola. Estas se revelaram muito mais que o necessário na colônia africana, e, pela Carta Régia de 10 de fevereiro de 1704 El-Rey as mandou circular no Brasil. Muito tempo depois um alvará de 1809 determinou um carimbo de um escudete nas moedas para duplicar seu valor, mas essa já é outra história.


Moedas falam, ou quase.




Lima, Fernando Carlos G. de Cerqueira. Uma Análise Crítica da Literatura Sobre a Oferta e a Circulação de Moeda Metálica no Brasil nos Séculos XVI e XVII. Disponível em <http://www.scielo.br/pdf/ee/v35n1/v35n1a06.pdf>. Acesso em 03 fev. 2013.
Idem, ibidem.
Coelho, Rafael da Silva Coelho. Moeda e antigo sistema colonial no Brasil: final do século XVII. Disponível em <http://www.cihe.fflch.usp.br/sites/cihe.fflch.usp.br/files/Rafael_Silva_Coelho.pdf>. Acesso em 03 fev. 2013.
Serrano Neto, José. Moedas Brasileiras da Colônia. Disponível em <http://www.snb.org.br/boletins/pdf/54%20-%20Moedas%20Brasileiras%20da%20Col%C3%B4nia.pdf>. Acesso em 03 fev. 2013.
AMATO, Cláudio, et alii. Livro das Moedas do Brasil: 1643 até 2012. 13ª ed. São Paulo: ed. dos autores, 2012.432p. p218-219.

3 comentários:

  1. ola meu nome e marcelo e tambem tenho uma pequena colesao de moedas eu tambem tenho uma igual asua do seculo xvI

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  2. Ola meu nome e geovani eu tenho uma moeda de 1699 que mihar irma achou no terreno baldiu da casa dela faz uns 5 dias que ela achou

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  3. Este comentário foi removido pelo autor.

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